No Te Va Gustar: o rock uruguaio em voga

Uma vitória pro rock sul-americano no Brasil

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Texto German martinez - Fotos Noelia Nájera

9/28/20256 min read

Pra contextualizar o que foi o show do No Te Va Gustar, nós temos que falar um pouco do rock uruguaio, que é pouco conhecido aqui no Brasil e que junto com o rock argentino nunca tenha rompido a bolha como deveria. Foi lá nos anos 60, que bandas como Los Shakers, que se influenciavam diretamente pelos Beatles, e os Los Mockers, que eram a resposta imediata á la The Rolling Stones, além disto tínhamos o Bulldogs, liderado pelo genial Kano, que trazia suas influências das bandas citadas, além dos The Kinks.

O Uruguai entrou nos anos 70, e trouxe bandas como El Kinto, ou candombe progressivo dos magistrais do Totem, capitaneados pelo insubstituível Rubén Rada. Tivemos bandas como Polenta, comandada por Khalil, imortalizado pelo Motosierra, numa versão incrível de Se Acabó el Confort. O punk também teve sua representatividade, com bandas como Los Traidores, Los Tontos, e Los Estómagos, das cinzas dessa surgiriam os estupendos Buitres. Em meados dos anos 80, a força das canções como a La Tabaré Riverock ou a irreverência dos gigantes do El Cuarteto de Nos. Ninguém estava preparado pro que viria acontecer com a revolução musical dos Chicos Elétricos, e junto deles Cadáveres Ilustres, Buenos Muchachos, La Hermana Menor.

Nos anos 90, bandas como La Abuela Coca, que trouxeram o reggae, o ska pra dentro das suas composições. E foi nessa fase que bandas como o No Te Va Gustar e a La Vela Puerca, que impecavelmente misturaram todas essas vertentes e colocaram num liquidificador musical. No começo da outra década tanto o No Te Va Gustar, La Vela Puerca, Buitres, La Trampa, Trotsky Vengaran tomaram de assalto a cena uruguaia, trazendo o rock pro seu devido lugar, as rádios, as TV's, as revistas voltaram a dar visibilidade pro rock feito lá. A mescla do rock, com pitadas de reggae, o balanço do ska, e raiz da música uruguaia como a murga, fez dessa miscelânea de influências, a principal característica da sonoridade da banda, aliadas às letras de Emiliano Brancciari, que falavam dos mais distintos sentimentos, e sempre muito cirúrgico em suas colocações.

A juventude usava as camisetas das bandas, comprava os discos, e lotava lugares como o Teatro de Verano, o Velódromo, ou festivais como o Pilsen Rock. Indo pro underground eles catapultaram pra cá, bandas espetaculares como os selvagens e icônicos Motosierra, Hablan Por La Espalda, Silverados, Rey Toro, Radical, Guachass.

O No Te Va Gustar, foi conquistando cada vez mais seu lugar nos estandartes do rock uruguaio, colecionando discos platina, através de seus mais de 10 discos lançados, e sendo bem recebido por crítica e público. E alçando vôos maiores pra países vizinhos, América do Norte, Europa. Novamente produzido pelo Festival Mucho, a banda voltava ao Brasil, já que em 2023, eles haviam tocado no Sesc Pompéia, e desta vez a apresentação seria no Cine Jóia.

A oportunidade agora era sua turnê comemorativa de 30 anos, que se alastra por 70 performances pelo mundo, pelo Brasil eles fizeram datas por Florianópolis, São Paulo e Porto Alegre. Sendo que São Paulo já tinha ingressos esgotados.

Vamos ao show, os arredores do Cine Jóia, já respirava o ar do rock sul-americano, com o pessoal do lado de fora ouvindo bandas de todo do nosso continente. Numa sexta fria, com baixa temperatura pra ser no mês de setembro, todos estavam devidamente agasalhados pra encarar o clima paulistano. Enquanto camisetas da banda eram vendidas do lado de fora, adentramos já com Flávia Durante, agitando as pick up's, com muito Rock Latino, e por muitas vezes colocando a galera pra cantar, no set, faixas como: La mosca Tsé Tsé (Para no verte más), Enanitos Verdes (Lamento boliviano), El Cuarteto de Nos (Ya no se que hacer conmigo), Los Abuelos de la nada (Cosas Mias), fizeram alegria dos convidados no esquenta do show.

Milimetricamente calculado pro início ás 00:00, que Emiliano Brancciari (guitarra e vocais), Guzmán Silveira (baixo), Pablo Coniberti (guitarra), Diego Bartaburu (bateria), Gonzalo Castex (teclados/percussão), Denis Ramos (trombone), Martín Gil (trompete), Maurício Ortiz (saxofone), subiram ao palco do Cine Jóia. Com o sorriso estampado no rosto de cada integrante, eles foram de cara pra uma faixa de 15 anos atrás que foi Cero A La Izquierda, que incendiou literalmente com seu refrão.

O romantismo lírico de Emiliano, se fez presente com a canção, A Las Nueve, do disco El Calor del Pleno Invierno, de 2012. A guitarra repetitiva de Pablo que se faz marcante em Comodín, conversava com os metais de Denis, Maurício, Martin. A presença de palco da banda é algo completamente fora da curva, todos realmente curtindo o momento e interagindo com o público presente, convidando sempre pra agitar e cantar, o papel que Denis Ramos desempenha é espetacular, cativando a quem for, em Verte Reír, essa foi a vibe de entrosamento entre público e banda.

Flertando com o lado mais eletrônico e dançante, El Camino garantiu espaço no desfile de hits. Durante uma parte do set, Emiliano empunha seu violão, e deixa esse momento pra canções com pegada mais folk, mas nem por isso o clima baixou, pelo contrário, tivemos faixas como De Nada Sirve, No Necesito Nada, e a emocionante Ese Maldito Momento, que possui uma das melodias mais brilhantes junto do solo excepcional de Pablo.

Todos saíram do palco e Diego, comandou seu solo de bateria, principalmente fazendo batuques que lembravam os carnavais uruguaios, com sua levada de murga & candombe.

Os metais fazem a introdução pras guitarras "rockeiras" de Emiliano e Pablo, pra botarem pra ferver em Más Mejor, aliados a um jogo de luzes intenso no palco, traduzindo num dos momentos mais explosivos da noite. Foi uma pena que canções como Me Cuesta Creer e La Única Voz, do magnífico Este Fuerte Viento que Sopla, de 2002, um dos maiores discos da discografia da banda. Mas tivemos boas pérolas desse disco como a magnífica Clara, e as já citadas No Necesito Nada e Más Mejor, esta imbatível, cantada a plenos pulmões por uma faixa etária já mais velha.

Pensar, a reflexão sob o ponto de vista do uruguaio de Emiliano, também se fez presente na noite. No Te Imaginás, que tem uma carga emocional enorme pois é dedicada aos filhos dos integrantes da banda. Em seguida, uma das nossas favoritas da casa, Venganza, onde a banda faz uma espécie de Electro Rock, e do riff quase "stoner", e foi impossível não recordar do videoclipe excepcional da canção.

A batida quase Ska, contagiou muito em Con El Viento, sendo um dos destaques da noite. O show caminhava pro fim, e daí veio Chau, que seria uma bela despedida pro protocolo da performance, e Emiliano, levou o astral lá pra cima convidando os paulistanos pra agitarem em Prendido Fuego. No Hay Dolor, trouxe o protagonismo do reggae, com imponente presença dos metais e o baixo preciso de Guzmán, e a voz de Martin, e obviamente colocando o povo pra cantar.

Obviamente iriam voltar pro bis, com a pulsante Fuera de Control, com Emiliano pondo a galera pra agitar o pogo e não podiam fechar da forma mais esperada possível com uma das faixas mais icônicas da banda, do seu disco de estréia, No Era Cierto, pra quebrar tudo, como fazem em seus shows locais, com as bandeiras uruguaias sendo hasteadas por toda parte, quem levou a sua, fez o mesmo papel.

O No Te Va Gustar, protagonizou uma das noites mais memoráveis deste ano de 2025, de casa cheia, mostrando que o rock latino ainda segue vivo e tem capacidade de promover momentos únicos, numa aposta certeira do Festival Mucho, que pontua mais uma vez no calendário de São Paulo.